quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

I Simpósio Luso-Brasileiro de Cartografia Histórica - O BRASIL NO SÉCULO XVIII/XIX E A FORMAÇÃO TERRITORIAL DAS MINAS GERAIS (Transcrição)

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2. “A vila de Campanha da Princesa”
As terras onde hoje se encontra Minas Gerais estavam englobadas no início da colonização portuguesa em território de capitanias hereditárias doadas a capitães donatários. Essas capitanias, como é sabido, tinham início no litoral da Colônia, sendo banhadas pelo Oceano Atlântico, e se estendiam para oeste até a linha divisória do meridiano de Tordesilhas. Por algumas décadas, com raras exceções, a ação dos colonizadores se concentraria no litoral.
Em finais do século XVII, tal situação sofreria sensível modificação. O povoamento do território paulista crescia e a “boca do sertão” era empurrada cada vez mais para o interior do território. O Vale do Paraíba, na Capitania de São Paulo, foi ocupado por homens corajosos que criaram povoados que se transformariam em pontos de partida para a ocupação do que viria a ser a Capitania de Minas Gerais.
A região onde hoje se localiza a cidade de Campanha, no sul do Estado de Minas Gerais, começou a ser percorrida quando os bandeirantes paulistas deixaram suas terras em busca de índios, posteriormente de ouro, e atravessam a serra da Mantiqueira pela garganta do Embau (hoje cidade de Cruzeiro em São Paulo) atingindo as cabeceiras do Rio Verde. A notícia de ouro nas terras banhadas por esse rio e pelo Sapucaí, chegou a São Paulo e rapidamente houve o deslocamento de homens para esta direção.
As “Minas do Rio Verde”, como era então denominada esta região, foi descoberta pelos paulistas em 1720 e tiveram pouca divulgação até 1737. Em 02 de outubro, uma expedição militar sob o comando do ouvidor da Vila de São João del Rei, Cipriano José da Rocha, com a incumbência dada pelo governador da capitania, D. Martinho de Mendonça de Pina e Proença, de reconhecer a região, desbravar os sítios desconhecidos ao longo da bacia dos Rios Verde, Sapucaí e Palmela e tomar posse do território em nome do rei. Em carta enviada ao Governador da Capitania, informa que
“as terras destas minas, é uma dilatada Campanha do Rio Lambari para dentro, exceto uma serra que tem seu princípio no mesmo rio e se dilata por espaço de uma légua, toda coberta de matos, por onde vem a estrada que mandei abrir e achei muito capaz; são os ares muito alegres de maravilhosa vista, e com melhor assento que as terras de São João Del Rei”(3)
Em outra carta, o Ouvidor diz sobre a região percorrida que esta compreendia “o descoberto em circuito mais de vinte léguas”. Comunicava também que havia fundado um “Arraial em forma de vila, a que deu o nome de São Cipriano, que está povoado com praça e ruas em boa ordem e muito boas casas, e fica-se entendido em fazer igreja (...)” e determinava também “terra para casa de Intendência”. A missiva trazia ainda a informação de que o arraial encontrava-se próximo a quatros rios “abundantíssimos de peixe grosso e miúdo”, isto é, o Palmela, o Lambari, o Sapucaí (descoberto por ele) e o Verde. Por fim, diz que
“Serão as ditas minas uma dilatada povoação, tendo por extensão, que cada dia cresce, como pela comodidade do país, terra produtiva de mantimento e os ares benévolos, rio Sapucaí, só conhecido pela tradição dos antigos paulistas, fiz descobrir pelo sertão destas Minas, por diligência e despesas minhas, até que pessoalmente fui as suas margens e o passei em canoa que mandei fazer”(4).
A denominação de Arraial de São Cipriano duraria pouco, voltando logo à designação anterior de “Arraial de Santo Antônio da Campanha do Rio Verde”. Com o crescimento e a prosperidade do arraial, foi criada a freguesia pelo bispado do Rio de Janeiro em 1741, com o nome de freguesia de “Santo Antônio do Vale da Piedade da Campanha do Rio Verde”.
No entanto, os conflitos entre paulistas e representantes legais da Comarca do Rio das Mortes pelo controle e posse da região das Minas do Rio Verde permaneceriam, a despeito da chegada do ouvidor e da criação do arraial. O governo da Capitania de São Paulo disputava com a Câmara da Vila de São João Del Rei o controle desta parte do território. Os conflitos não cessaram rapidamente, fazendo com que o senado da câmara da Vila de São João Del Rei necessitasse em 1743 de reafirmar a auto de ocupação de posse da região, devido à presença de um represente do governo paulista no local, reivindicando o direito de posse sobre o arraial(5). De acordo com os registros do relatório da câmara, foi necessário o gasto de 264 oitavas de ouro e a presença de gente armada para se garantir a ocupação da área, pois o Governador da Capitania de São Paulo, D. Luiz de Mascarenhas, havia nomeado Bartolomeu Correa Bueno como superintendente da região. Como meio de defender e assegurar a posse da área, pois tratava-se de região estratégica, de acesso fácil tanto ao Rio de Janeiro como a São Paulo, e portanto para impedir também o extravio do ouro, criou-se o Julgado de Santana do Sapucaí no ano de 1746 e o estabelecimento de um juiz ordinário. Estes conflitos se acirrariam com os motins de Campanha do Rio Verde em 1746 e 1751(6).
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Nota: Parafraseando, a expedição militar sob o comando do ouvidor da Vila de São João del Rei, deixando essa localidade, tinha como objetivo desbravar os sítios que não eram assim tão desconhecidos ao longo da bacia do Rio Verde, Sapucai e Palmela. O sentido percorrido foi do Norte em direção ao Sul e, estando necesariamente, na margem direita do rio Sapucaí, esclarece que passou em canoa que mandou fazer. No mesmo contexto, temos o expresso reconhecimento de que, em finais do século XVII, o povoamento do território paulista crescia e a "boca do sertão" era empurrada cada vez mais para o interior do território. Ou seja, em se tratando do Vale do Paraiba, na Capitania de São Paulo, onde homens corajosos criaram povoados que, transformariam em pontos de partidas para ocupação do que viria a ser a Capitania de Minas Gerais, é possível ter dúvida de que está se falando de Taubaté e Guaratinguetá? Desta feita, é possivel concluir que, se de um lado, o caminho percorrido via Garganta do Embaú, levava a cabeceira do Rio Verde, a boca do sertão empurrada cada vez mais para o interior do território, pelo paulista, corresponde exatamente ao Núcleo Embrião de Piquete, acesso a cabeceira do Rio Sapucai. Ou do contrário é possível crer que, Guaratinguetá, o maior entrepostos de abastecimento das Minas por mais de 300 anos, não tivesse uma ligação direta com o Alto Sapucaí? Consequentemente, em se tratando de boca do sertão, não estamos falando do Sertão dos Índios Bravos, da Garganta do Sapucaí, no Alto da Serra, onde veio a se instalar o registro de Itajubá. Restando absurdo cogitar da hipotese no sentido que, pudesse depender os mercadores do Vale do Paraíba da via Garganta do Embaú, para alcançar o Alto Sapucaí, sendo certo que esse ultimo caminho, designado, caminho dos paulista, caminho geral do sertão, transformou-se na Estrada Real que ligava Guaratinguetá a São João Del Rei, a qual aparece também como, Estrada Real do Sertão.





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